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por Marcos Manoel Ferreira,, especial para o LiceuOnline.

A trajetória da humanidade foi alicerçada por mendacidade, interesses, intrigas e sangue. De verdugos dissimulados da moral religiosa, ancorados na legalidade parcial, atulhado de pacóvios perseguidores de quem pensa, bajuladores de pusilânimes, cortejadores de assassinos com status de heróis! Impossível não lembrar Nelson Rodrigues, “os idiotas vão tomar conta do mundo; não pela capacidade, mas pela quantidade. Eles são muitos”.

A educação foi sempre a grande ameaça para qualquer governo comandado por parvos e opressores. A luz em tempos sombrios a liberdade para mentes aprisionadas na empáfia dos ordinários. Um povo que pensa, incomoda e transforma. José Martí muitíssimo bem definiu esse processo, “ser culto, para ser livre”.

O conhecimento, o saber acadêmico, a leitura, a arte, jamais serão prioridades, pautas sob a rédea ardilosa de qualquer déspota e inepto. Balbúrdia palaciana, entre zurros e solavancos, o escancarado ataque a ciência, a pesquisa, escárnio do conhecimento, um processo assustador de ignorância generalizada, um festival de bestialidade coletiva e de impropérios. “O homem não é nada além daquilo que a educação faz dele” ou a falta dela.

A leitura é arma poderosa contra qualquer sociedade maculada pela injustiça institucionalizada, a ignorância e os honoráveis canalhas. Não há progresso sem ciência e não há ciência sem pesquisa. Ler é o instrumento de liberdade, via de acesso ao poder de pensar, refletir, passaporte para o conhecimento e construção de uma visão crítica de uma sociedade fadada ao fracasso, diante do apreço torpe pelo obscurantismo. Voar sem sair do lugar, redescobrir mundos e a fantasia como bálsamo para os martírios da vida real, comandada por asnos com status de puro sangue. Entre zurros e relinchos, a leitura traduz a onomatopeia verborrágica que fomenta a sanha dos idiotas e potencializa a estupidez humana! Já dizia o imortal Carlos Drummond de Andrade, “a leitura é uma fonte inesgotável de prazer, mas, por incrível que pareça, a quase totalidade, não sente essa sede”.

Segundo especialistas, pesquisas comprovam os benefícios da leitura para a saúde mental. Como por exemplo, o aumento da empatia, fortalecimento da criatividade, redução dos riscos do desenvolvimento de Alzheimer ou demência na fase adulta, aumento da expectativa de vida e os níveis de stress, inclusive, a biblioterapia – “uso de leituras terapêuticas para reduzir o estresse, sintomas de distúrbios como depressão ou alguma perturbação emocional”.

O papel dos pais, dos adultos, é fundamental nesse processo de apropriação da leitura, com a responsabilidade e o compromisso de desenvolver, despertar o interesse, incentivar, cultivar o hábito, o prazer da leitura nas crianças. Ler e apaixonar-se por ela, cada dia mais, um exercício diário, um hobby que vai além da satisfação de simplesmente se perder/encontrar entre páginas e páginas do mundo na palma da mão! É compreender que esse é o único caminho para reflexão com criticidade, ante um universo repleto de ódio, intolerância, insultos a inteligência, violência, miséria e descaso histórico com uma educação libertadora e que não atente tão somente, aos interesses e a bazófia dos opressores, de uma elite cultural, intelectual e econômica, além de irresponsável, uma sentença do atraso, para nossa minguada dignidade! Ler é o que nos faz humanos.

Expor as crianças a um ambiente de livros – em casa ou fora dela – outra alternativa importantíssima para estimular nelas, a predileção pela leitura, criatividade e a escrita. Assim como se aprende a degustar alguns alimentos ainda na mais tenra idade e apuram o paladar, desenvolvendo uma dieta mais saudável que tanto bem faz a saúde, o mesmo acontece com a leitura, a música, a arte, ativar a fantasia e uma relação com o mundo, sob outras perspectivas, possibilidades, nutrindo a alma e o intelecto. É um eviterno “viver e não ter vergonha de ser feliz” cantava o genial Gonzaguinha.

Proliferar bibliotecas e o acesso aos livros e a leitura — “Oh! Bendito o que semeia / Livros à mão cheia / E manda o povo pensar…” — já dizia o poeta dos escravos, Castro Alves. Reduzir os custos e aumentar os incentivos fiscais voltados para as produções literárias e artísticas, promovendo a proximidade com os clássicos regionais, nacionais e internacionais – Bernardo Élis, Cora Coralina, Bariani Ortêncio, José Mendonça Teles, Yêda Schmaltz, Marietta Telles, Machado de Assis, Lima Barreto, Graciliano Ramos, João Cabral, Guimarães Rosa, Jorge Amado, Homero, Dante, Shakespeare, Camões, Cervantes, Tolstói, Dostoiévski – fomentar a formação de novos escritores, possibilitarem o contato cada vez maior de crianças e adultos ao universo das letras, das ideias, dos debates, produções literárias dos mais diversos gêneros, buscando formar uma sociedade de leitores cada vez maior e que compreendam que a educação, a leitura e a escrita, extrapola o ambiente escolar e é responsabilidade de todos.

É constrangedor, pesado um país que ostenta índices de analfabetismo como o nosso – 11,8 milhões – além de outros milhões de analfabetos funcionais e ainda o disparate dos ataques oficiais de quem deveria combater essa vergonha nacional – como vem ocorrendo com a EAJA – Educação de Adolescentes Jovens e Adultos! Fechando salas de aulas no turno noturno e tirando novamente o direito sagrado de trabalhadores anônimos, cidadãos sedentos de terem acesso a educação formal que sempre lhes foram negada. Sob um discurso tacanho de “baixa demanda e escassez do erário”. Agora, se estão achando caro investirem em educação, experimente a ignorância, aquela que nos é tão familiar! Educação pública não pode ser compreendida como gasto, a finalidade não é gerar lucro, é investimento e respeito à Constituição, à cidadania e à dignidade. Que somente serão efetivadas com a construção de novas oportunidades.

Portanto, o dramaturgo alemão Bertolt Brecht já afirmava em um de seus magníficos escritos, que de todos os analfabetos, o pior é O Analfabeto Político – “ele não ouve, não fala, nem participa dos acontecimentos políticos…” – e Mário Quintana, o verdadeiro analfabeto é aquele que sabe ler e não lê. Como nas cartas de Bukowski na perspectiva de seu editor Abel Debritto escrever para não enlouquecer, ler e querer são os primeiros passos, principalmente, quando se tem oportunidade.

Imagem: Heloisa Xavier C. Vieira – para o projeto cidade retalho.

Sobre o(a) Autor(a)

Marcos Manoel Ferreira,

Professor, Historiador e Pedagogo. Especialista em História e Cultura Afro-brasileira e Africana; Mestrando em História – Cultura, Religião e Sociedade – pela Universidade Estadual de Goiás (UEG), [email protected]
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Comentários...

This Post Has 4 Comments

  1. Muito bem Professor Marcos Manoel, ótimo texto, uma radiografia do nosso momento, onde a ignorância tenta ofuscar a liberdade dos pensadores, devemos dizer não todos os dias ao retrocesso e nossa principal arma, não é a dos justiceiros que tem espoleta , pólvora e projétil, nossa arma tem páginas demarcadas por números, viva a leitura, viva os formadores de opinião.

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